Às vezes nossas vidas corridas e preocupadas nos privam de reconhecer momentos significativos que chegam sem qualquer aviso, como o que aconteceu comigo, recentemente. Eu estava parada no sinal de trânsito, em frente a Estação Cultura, na velha e querida Zafira que serve nossa família há quase duas décadas.
Um homem que eu nunca havia visto antes veio até a janela. Ele sorriu e comentou sobre o carro com um carinho surpreendente para quem pensa rotineiramente pensa em substitui-la.
Disse que tinha sido mecânico da antiga companhia de ônibus Bonavita e que se lembrava bem dos modelos antigos como o meu, salientando suas qualidades. Falou com um certo ar de nostalgia, com intimidade , como um amante secreto do qual nunca soubemos. O sinal abriu e quis me certificar que tinha seu nome direito: me desejou bom dia e deixou inspiração.
Se eu estivesse com a janela fechada, talvez por precaução até legítima, não teria tido essa troca. Um encontro breve, um detalhe insignificante na rotina de qualquer um, mas que, de algum modo, se tornou um lembrete de como pequenos momentos e gestos de estranhos podem dar outro tom ao nosso dia. Foi um momento tão espontâneo, e, ainda assim, carregado de humanidade.
Essas histórias que passam por nós no trânsito, nas ruas, nas filas, são como pequenas janelas para uma rede de vidas que nos rodeia. No mundo moderno, sempre tão apressado, é fácil ignorar as pessoas e os encontros que surgem ao acaso. Mas ao abrir um pouco mais as janelas — tanto as dos carros quanto as do coração —, acabamos permitindo que esses momentos se transformem em algo maior, algo que talvez só entendamos mais tarde.
Espero que possamos estar mais presentes e permitir que essas pequenas histórias nos encontrem e nos toquem. Afinal, são elas que, muitas vezes, nos lembram de quem somos e da beleza que existe em cada encontro, por mais breve e improvável que seja.
Em trânsito.
Valéria Monteiro.
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