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“O Aprendiz”: Monstro ou Sobrevivente?

O filme, dirigido por Ali Abbasi, entrega mais do que um retrato das origens de Trump; é um estudo de sua relação simbiótica com Roy Cohn, interpretado com um magnetismo ameaçador por Jeremy Strong.
Por Valéria Monteiro.
Ao final de O Aprendiz, uma pergunta inquietante permanece: Donald Trump se transformou no monstro que o moldou ou usou as lições de Roy Cohn para sustentar um papel que, no fundo, nunca foi o seu – o de protagonista?
O filme, dirigido por Ali Abbasi, entrega mais do que um retrato das origens de Trump; é um estudo de sua relação simbiótica com Roy Cohn, interpretado com um magnetismo ameaçador por Jeremy Strong. Mentor e manipulador, Cohn ensina a Trump os jogos de poder, a ausência de escrúpulos e a rejeição à fraqueza. Já Sebastian Stan, indicado ao Oscar de melhor ator, é um jovem Trump que parece tanto encantado quanto sufocado por esse universo, oscilando entre a absorção dessas lições e uma tentativa de encontrar seu lugar nele.
Trump é pintado como alguém ambicioso, sim, mas também como um sobrevivente, um homem que entende cedo que a fachada importa mais do que a substância. A cena em que ele descarta Cohn no momento de sua maior vulnerabilidade é o ponto alto do filme – um gesto de frieza que tanto repete os ensinamentos do mentor quanto revela um desconforto, quase um desejo de se libertar de sua sombra.
E aí reside o maior mérito de O Aprendiz: a ambiguidade. O filme não entrega respostas fáceis sobre quem Trump é. Ele é vítima ou cúmplice? Um monstro formado por Cohn ou um ator cínico que aprendeu a manipular as regras do jogo? Ali Abbasi parece nos dizer que talvez ele seja as duas coisas.
Esse dilema se torna ainda mais relevante considerando o contexto da reeleição recente de Trump. No mundo real, ele se apresenta como um protagonista absoluto, mas o filme lança dúvidas sobre quão autêntico esse papel é. Ele é realmente o homem que domina a cena ou apenas alguém que se tornou hábil em encenar uma versão exagerada de si mesmo para satisfazer o público e manter-se no poder?
Sebastian Stan capta esse conflito interno de forma brilhante. Não é só a imitação de Trump – a voz, os gestos, o carisma calculado. É a maneira como ele carrega o peso da dúvida em cada olhar, como se perguntasse a si mesmo: “É isso que eu sou agora? É isso que sempre fui?”.
Enquanto O Aprendiz entretém com seu drama e seu humor ácido, ele também deixa um gosto agridoce. Trump, no filme, é tanto arquiteto de sua própria ascensão quanto prisioneiro das ferramentas que o construíram. Como espectadora, terminei o filme me perguntando: o verdadeiro Donald Trump se tornou o monstro que o criou ou é, ainda hoje, alguém tentando sustentar um papel que nunca foi dele?
Seja qual for a resposta, O Aprendiz nos lembra que a jornada de Trump – como personagem histórico e figura política – ainda está longe de terminar. E talvez, no final, a maior tragédia não seja apenas quem ele se tornou, mas o que ele continua a sacrificar para manter o show em andamento.
